sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

LITURGIA DA PALAVRA – II DOMINGO DA QUARESMA




(Domingo, 1 de Março de 2015)


Este é o meu Filho muito amado

LEITURA I – Gen 22, 1-2.9a.10-13.15-18

O sacrifício do nosso Patriarca Abraão

Depois da história de Noé, no domingo passado, lemos hoje a história de Abraão e do sacrifício de seu filho Isaac, sobre o monte Moriá. Mas Deus nunca quis sacrifícios humanos. Abraão demonstrou a sua vontade de completa obediência a Deus e recuperou o seu filho, vivo, que assim se tornou uma figura de Cristo na sua ressurreição.

Leitura do Livro do Génesis
Naqueles dias, Deus quis pôr à prova Abraão[1] e chamou-o: «Abraão!». Ele respondeu: «Aqui estou». Deus disse: «Toma o teu filho, o teu único filho, a quem tanto amas, Isaac, e vai à terra de Moriá[2], onde o oferecerás em holocausto, num dos montes que Eu te indicar. Quando chegaram ao local designado por Deus, Abraão levantou um altar e colocou a lenha sobre ele. Depois, estendendo a mão, puxou do cutelo para degolar o filho. Mas o Anjo do Senhor gritou-lhe do alto do Céu: «Abraão, Abraão!». «Aqui estou, Senhor», respondeu ele. O Anjo prosseguiu: «Não levantes a mão contra o menino, não lhe faças mal algum. Agora sei que na verdade temes a Deus, uma vez que não Me recusaste o teu filho, o teu filho único»[3]. Abraão ergueu os olhos e viu atrás de si um carneiro, preso pelos chifres num silvado. Foi buscá-lo e ofereceu-o em holocausto, em vez do filho. O Anjo do Senhor chamou Abraão do Céu pela segunda vez e disse-lhe: «Por Mim próprio te juro[4] – oráculo do Senhor – já que assim procedeste e não Me recusaste o teu filho, o teu filho único, abençoar-te-ei e multiplicarei a tua descendência como as estrelas do céu e como a areia das praias do mar, e a tua descendência conquistará as portas das cidades inimigas[5]. Porque obedeceste à minha voz, na tua descendência serão abençoadas todas as nações da terra».
Palavra do Senhor.”

LEITURA II – Rom 8, 31b-34

Deus não poupou o seu próprio Filho

Esta leitura mostra como Jesus realiza até ao fim a figura de Isaac, anunciada na leitura anterior, e como o amor de Abraão é imagem do amor infinito de Deus pelos homens. Deus, que não quis que Abraão Lhe oferecesse o filho em sacrifício, permitiu que o seu muito amado filho Jesus fosse sacrificado, em expiação dos nossos pecados. De facto, toda a história da salvação atinge o seu ponto mais alto em Nosso Senhor Jesus Cristo.

Leitura da Epístola do apóstolo São Paulo aos Romanos
“Irmãos: Se Deus está por nós, quem estará contra nós? Deus, que não poupou o seu próprio Filho, mas O entregou à morte por todos nós, como não havia de nos dar, com Ele, todas as coisas? Quem acusará os eleitos de Deus, se Deus os justifica? E quem os condenará, se Cristo morreu e, mais ainda, ressuscitou, está à direita de Deus e intercede por nós?[6]
Palavra do Senhor.

EVANGELHO – Mc 9, 2-10

Este é o meu Filho muito amado

A Transfiguração, lida neste Domingo, depois de, no Domingo anterior, ter sido escutada a tentação, faz com ela, como que num grande painel de duas alas, uma espécie de grande abertura da Quaresma: mortificação e glorificação, tentação e glória, morte e ressurreição; são elas, de facto, a síntese do Mistério Pascal que vamos celebrar na Páscoa. Jesus vive em Si o mistério que a sua Igreja agora celebra, e que ela viverá até à sua própria Transfiguração.

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Marcos
“Naquele tempo, Jesus tomou consigo Pedro, Tiago e João e subiu só com eles para um lugar retirado num alto monte e transfigurou-Se diante deles[7]. As suas vestes tornaram-se resplandecentes, de tal brancura que nenhum lavadeiro sobre a terra as poderia assim branquear. Apareceram-lhes Moisés e Elias, conversando com Jesus. Pedro tomou a palavra e disse a Jesus: «Mestre, como é bom estarmos aqui! Façamos três tendas: uma para Ti, outra para Moisés, outra para Elias». Não sabia o que dizia, pois estavam atemorizados. Veio então uma nuvem que os cobriu com a sua sombra e da nuvem fez-se ouvir uma voz: «Este é o meu Filho muito amado: escutai-O». De repente, olhando em redor, não viram mais ninguém, a não ser Jesus, sozinho com eles. Ao descerem do monte, Jesus ordenou-lhes que não contassem a ninguém o que tinham visto, enquanto o Filho do homem não ressuscitasse dos mortos. Eles guardaram a recomendação, mas perguntavam entre si o que seria ressuscitar dos mortos”.
Palavra da salvação.





[1] Este é um dos textos mais belos da Bíblia. Por detrás do sacrifício de Isaac deve estar o costume pagão de sacrificar seres humanos, o que a Bíblia condena (Lv 18,21; 20,2; Dt 12,31). O autor mostra-nos Abraão perante o dilema de sacrificar o filho querido, no qual encarna a promessa de Deus, ou "sacrificar" a Deus. Como não sacrifica Deus, também salva o filho. Aparece ainda o contraste entre a ignorância de Abraão acerca do que Deus realmente quer (como pode querer a morte daquele filho que Ele próprio prometera?), e a sabedoria de Deus. Abraão fecha os olhos e o pensamento a todo o raciocínio, para confiar unicamente na palavra de Deus. Este acto de fé ficou para sempre como modelo de fé e fez de Abraão o pai dos crentes.
[2] Região de Moriá. Em hebr., este termo significa "visão". Segundo a tradição, tratar-se-ia da região montanhosa onde, mais tarde, foi construído o templo de Salomão (2 Cr 3). Mas é muito difícil precisar a sua identificação (Mq 6,7; Mt 10,37).
[3]  Deus condena os sacrifícios humanos, que existiam entre os cananeus (Lv 18,21; Dt 12,31; 18,10; 2 Rs 16,3; 17,17; 21,6; 23,10; Is 30,33; Jr 7,31-34; 19,5; 32,35; Ez 16,20-22 nota; 20,31; Heb 11,19). No entanto, os primogénitos serão "oferecidos" a Deus e, depois, resgatados (Ex 13,1-2.11-15; 22,28-29; 34,19-20).
[4] Juro por mim mesmo. Aqui o "anjo do Senhor" identifica-se com o próprio Deus. Por isso, não jura por alguém maior do que Ele. O sacrifício de Abraão mereceu-lhe a renovação da promessa de 12,1-3 (ver 15,5; Lc 1,73; Heb 6,13-18).
[5] Apoderar-se das cidades - lit., "uma cidade inimiga" - significa conquistá-las (24,60). Talvez haja alusão à conquista de Jerusalém por David (2 Sm 5,6-10).
[6] A certeza de que Deus nem na desgraça abandona os que o amam (v.18-30) é agora celebrada. Primeiro somos levados ao julgamento a que seremos sujeitos no final da História (v.31-34). Aí, quem nos irá condenar? Ninguém dos que têm poder para o fazer: nem Deus que, já no presente, nos faz justos (Is 50,8), nem Cristo que, morto e ressuscitado, intercede por nós junto de Deus (Heb 7,26-27 ; 1 Jo 2,1 ). Quem poderá separar-nos do amor de Cristo? (v.35-39). Se Paulo venceu todas as tribulações (sete) a que fora sujeito por causa do anúncio do Evangelho (v.36; Sl 44,23), pela força vivificante desse amor (1 Cor 4,10-13 ; 15,30-32 ; 2 Cor 4,8-12 ), então criatura alguma terrestre ou supraterrestre nos poderá separar dele (Fl 2,9-11). Um desafio à nossa plena convicção de fé de que Deus está "por nós" (3 vezes nos v.31-34).
[7] Este monte elevado que, na tradição, é identificado com o Tabor (562 m), não longe de Nazaré, teria mais justificação num dos cimos do Hermon (2.760 m), próximo de Cesareia de Filipe, onde Marcos e Mateus acabam de situar a confissão de Pedro (8,27-30). Não interessa tanto o monte em si mesmo, quanto o seu alcance teológico; este emerge da evocação que se faz da teofania do Sinai (Ex 19,3-25) e do paralelismo que se estabelece entre o Jesus da Transfiguração e o Deus do Sinai: Jesus é igual ao Deus do AT, Ele é verdadeiro Deus. A insistência na brancura (v.3) das suas vestes - cor que manifesta a glória celeste (Mt 28,3; Ap 3,4-5; 4,4) - pretende manifestar a divindade de Jesus. Mas Ele também assume e aperfeiçoa a missão profética de Elias, assim como a missão legislativa de Moisés.

sábado, 21 de fevereiro de 2015

LITURGIA DA PALAVRA – I DOMINGO DA QUARESMA




(Domingo, 22 de Fevereiro de 2015)


Era tentado por Satanás e os Anjos serviam-n’O

LEITURA I – Gen 9, 8-15

A aliança de Deus com Noé, salvo das águas do dilúvio

A primeira leitura dos domingos da Quaresma não está em ligação com a do Evangelho, como nos domingos do Tempo Comum. Refere-se à história da salvação, mostrando como Deus encaminhou os passos da humanidade, desde os tempos mais antigos até à realização da promessa da nova Aliança em Jesus Cristo. Este ano, começamos com Noé. O dilúvio termina com uma aliança, que anuncia desde logo a aliança estabelecida entre Deus e os homens na Morte e Ressurreição de Cristo. Por outro lado, no próprio dilúvio Deus quis significar a regeneração espiritual do baptismo, pois nele, como no dilúvio, a água se tornou, simbolicamente, “fim de vícios e origem de virtudes” (liturgia baptismal).

Leitura do Livro do Génesis
Deus disse a Noé e a seus filhos: «Estabelecerei a minha aliança convosco, com a vossa descendência e com todos os seres vivos que vos acompanham: as aves, os animais domésticos, os animais selvagens que estão convosco, todos quantos saíram da arca e agora vivem na terra[1]. Estabelecerei convosco a minha aliança: de hoje em diante nenhuma criatura será exterminada pelas águas do dilúvio e nunca mais um dilúvio devastará a terra». Deus disse ainda: «Este é o sinal da aliança que estabeleço convosco e com todos os animais que vivem entre vós, por todas as gerações futuras: farei aparecer o meu arco sobre as nuvens, que será um sinal da aliança entre Mim e a terra[2]. Sempre que Eu cobrir a terra de nuvens e aparecer nas nuvens o arco, recordarei a minha aliança convosco e com todos os seres vivos e nunca mais as águas formarão um dilúvio para destruir todas as criaturas[3]».”

LEITURA II – 1 Pedro 3, 18-22

O Baptismo que agora vos salva

S. Pedro faz nesta leitura o comentário ao dilúvio, estabelecendo a comparação entre este e o baptismo. O baptismo é hoje o verdadeiro dilúvio, que destrói o pecado e faz nascer uma nova humanidade em Cristo. Assim, a história da salvação chega a todas as gerações e todas elas são arrastadas na sua corrente de graça.

Leitura da Primeira Epístola de São Pedro
“Caríssimos: Cristo morreu uma só vez pelos pecados – o Justo pelos injustos – para vos conduzir a Deus. Morreu segundo a carne, mas voltou à vida pelo Espírito[4]. Foi por este Espírito que Ele foi pregar aos espíritos que estavam na prisão da morte e tinham sido outrora rebeldes, quando, nos dias de Noé, Deus esperava com paciência, enquanto se construía a arca, na qual poucas pessoas, oito apenas, se salvaram através da água. Esta água é figura do Baptismo que agora vos salva, que não é uma purificação da imundície corporal, mas o compromisso para com Deus de uma boa consciência; ele vos salva pela ressurreição de Jesus Cristo[5], que subiu ao Céu e está à direita de Deus, tendo sob o seu domínio os Anjos, as Dominações e as Potestades.”

EVANGELHO – Mc 1, 12-15

Era tentado por Satanás e os Anjos serviam-n’O

“O Senhor Jesus Cristo era tentado pelo demónio no deserto. Mas em Cristo também tu eras tentado, porque Ele tomou sobre Si a tua condição humana, para te dar a salvação; para Si tomou as tuas tentações, para te dar a sua vitória” (S. Agostinho). A vitória de Jesus sobre Satanás proclamada neste primeiro Domingo da Quaresma anuncia desde já o triunfo pascal da sua Morte e Ressurreição, e oferece-nos, ao mesmo tempo, a participação nessa sua vitória sobre o pecado e a morte.

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Marcos
“Naquele tempo, o Espírito Santo impeliu Jesus para o deserto. Jesus esteve no deserto quarenta dias e era tentado por Satanás. Vivia com os animais selvagens e os Anjos serviam-n’O. Depois de João ter sido preso, Jesus partiu para a Galileia e começou a pregar o Evangelho, dizendo: «Cumpriu-se o tempo e está próximo o reino de Deus[6]. Arrependei-vos e acreditai no Evangelho».”





[1] Aliança cósmica. A Aliança, coluna vertebral do Antigo e do NT, é um contrato ou pacto que Deus faz com o homem. Fá-lo com Noé, sobre as presentes leis; com Abraão, sobre a descendência e a promessa (cap. 15 e 17); com Moisés, constituindo um novo povo (Ex 19,1-25) e, finalmente, com toda a humanidade, em Cristo (Mt 26,28).
[2] Arco-íris. Sabemos que, após uma tempestade, o arco-íris, refracção da luz solar através da chuva, anuncia bonança, como um poente avermelhado anuncia bom tempo. Os antigos viam, nestes fenómenos naturais, manifestações da bondade divina (Ez 1,28).
[3] Temos aqui a referência bíblica mais clara à verdade do credo acerca de Jesus que "desceu à mansão dos mortos" (4,6; Mt 12,38-42; Lc 23,43; Act 2,25.31; Rm 10,6-7; Ef 4,8-9.8 nota; Ap 1,18), a anunciar-lhes a mensagem da salvação, segundo uns com a sua alma separada do corpo, segundo outros, na sua nova condição de glória alcançada com a sua morte (v.18). O texto, ao dizer que Jesus também pregou aos maiores pecadores, os rebeldes do tempo de Noé (Gn 7,2.7.17; Mt 24,37; 2 Pe 2,5 nota), põe em evidência o alcance universal da Redenção para todos os pecadores arrependidos. "Mansão dos mortos" (o Cheol hebraico, o Hades ou Tártaro grego, os Infernos, em latim) representa a residência dos que tinham morrido, que se pensava ser num espaço interior da Terra (Nm 16,33; 1 Sm 28,13; Sl 7,6; Ez 26,20; Lc 16,23; 2 Pe 2,4).
[4] O final deste versículo pode entender-se: morto como homem e vivo como Deus (Rm 1,3-4; 1 Tm 3,16); ou talvez se trate de uma formulação primitiva para exprimir que Jesus, ao morrer, abandonou de vez a sua condição mortal para passar, com a ressurreição, a viver no seu estado glorioso e imortal. Alguns entendem espírito como a alma humana de Jesus, com que Ele desceu à mansão dos mortos (2,19.24-25; Rm 6,10; Heb 9,28).
[5] Temos aqui a referência bíblica mais clara à verdade do credo acerca de Jesus que "desceu à mansão dos mortos" (4,6; Mt 12,38-42; Lc 23,43; Act 2,25.31; Rm 10,6-7; Ef 4,8-9.8; Ap 1,18), a anunciar-lhes a mensagem da salvação, segundo uns com a sua alma separada do corpo, segundo outros, na sua nova condição de glória alcançada com a sua morte (v.18). O texto, ao dizer que Jesus também pregou aos maiores pecadores, os rebeldes do tempo de Noé (Gn 7,2.7.17; Mt 24,37; 2 Pe 2,5), põe em evidência o alcance universal da Redenção para todos os pecadores arrependidos. "Mansão dos mortos" (o Cheol hebraico, o Hades ou Tártaro grego, os Infernos, em latim) representa a residência dos que tinham morrido, que se pensava ser num espaço interior da Terra (Nm 16,33; 1 Sm 28,13; Sl 7,6; Ez 26,20; Lc 16,23 nota; 2 Pe 2,4).
[6] Do Reino de Deus, que Jesus começa a implantar, se diz que está próximo. Nunca se diz nos Evangelhos em que consiste. É algo que não vem de maneira ostensiva, mas actua a partir do interior das pessoas (Lc 17,21). Pode dizer-se que é uma forma nova, definitiva, de relacionamento com Deus, por meio de Jesus Cristo "o que era, o que é e que há-de vir" (Ap 4,8). A conversão interior é condição imprescindível para nele se entrar (4,26-29; Mt 3,2; 6,10; Lc 17,20-21).

sábado, 14 de fevereiro de 2015

LITURGIA DA PALAVRA – DOMINGO VI DO TEMPO COMUM




(Domingo VI, 15 de Fevereiro de 2015)


A lepra deixou-o e ele ficou limpo

LEITURA I – Lev 13, 1-2.44-46

O leproso deverá morar à parte, fora do acampamento

Esta leitura prepara-nos para melhor compreendermos a do Evangelho. Ali Jesus vai curar um doente de lepra. Nesta leitura, são recordadas as prescrições da Lei do Antigo Testamento a respeito dos leprosos. A situação destes doentes era verdadeiramente infeliz. Tanto mais se poderá ver na cura que o Senhor fez um sinal do seu poder e da sua misericórdia.

Leitura do Livro do Levítico
1O SENHOR disse a Moisés e a Aarão[1]: 2«Quando um homem tiver na pele do seu corpo um tumor, uma doença de pele ou uma mancha, podendo degenerar numa afecção leprosa sobre a pele[2], será apresentado ao sacerdote Aarão, ou a um dos sacerdotes seus descendentes. 44essa pessoa é leprosa, é impura; o sacerdote declará-la-á impura; o mal atingiu-a na cabeça. 45E o leproso atingido por tal afecção deve rasgar as roupas, desalinhar o cabelo, tapar-se até à boca e gritar: 'Impuro!... Impuro!' 46Enquanto conservar a chaga, será impuro, viverá isolado, e a sua residência será fora do acampamento.[3]»”

LEITURA II – 1 Cor 10, 31 – 11, 1

Sede meus imitadores, como eu o sou de Cristo

Paulo propõe-se a si mesmo como modelo aos cristãos, porque ele tem por modelo o próprio Cristo. O que ele pretende é que ninguém seja ocasião de pecado para os outros, mas antes de edificação e de salvação.

Leitura da Primeira Epístola do apóstolo S. Paulo aos Coríntios
“10 31Portanto, quer comais, quer bebais, quer façais qualquer outra coisa, fazei tudo para glória de Deus. 32Não vos torneis ocasião de escândalo, nem para os judeus, nem para os gregos, nem para a Igreja de Deus. 33Fazei como eu, que me esforço por agradar a todos em tudo, não procurando o meu próprio interesse mas o do maior número, a fim de que eles sejam salvos.
11 1Sede meus imitadores, como eu o sou de Cristo.”

EVANGELHO – Mc 1, 40-45

A lepra deixou-o e ele ficou limpo

Uma vez mais, Jesus Se mostra Senhor da vida. Por outro lado, mostra-Se livre em relação à Lei e superior a ela: toca no doente, o que era contrário à Lei, mas manda que o homem curado se vá mostrar aos sacerdotes, o que era exigência da Lei. Jesus é realmente a fonte da vida nova; Ele é hoje o Ressuscitado.

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Marcos
40Um leproso veio ter com Ele, caiu de joelhos e suplicou: «Se quiseres, podes purificar-me.» 41Compadecido, Jesus estendeu a mão, tocou-o e disse: «Quero, fica purificado.» 42Imediatamente a lepra deixou-o, e ficou purificado. 43E logo o despediu, dizendo-lhe em tom severo: 44«Livra-te de falar disto a alguém; vai, antes, mostrar-te ao sacerdote e oferece pela tua purificação o que foi estabelecido por Moisés, a fim de lhes servir de testemunho[4]
45Ele, porém, assim que se retirou, começou a proclamar e a divulgar o sucedido, a ponto de Jesus não poder entrar abertamente numa cidade; ficava fora, em lugares despovoados. E de todas as partes iam ter com Ele.”





[1] A lepra era considerada a doença mais terrível. Daí o cuidado em evitá-la a todo o custo, excluindo o leproso da comunidade e destruindo as coisas que tivessem manchas de lepra. A legislação mosaica sobre a lepra está elaborada sem preocupações terapêuticas, porque o seu fim é defender e preservar a comunidade religiosa de qualquer contaminação. Os elementos do diagnóstico e da profilaxia são empíricos, embora se note um esforço de observação e de análise superior aos que se encontram, por ex., nos rituais babilónicos e assírios. O termo lepra não tem aqui o sentido técnico da ciência médica contemporânea. Para o autor sagrado, eram tidas como lepra as dermatoses e certas alterações dos tecidos e das vestes, a que se dá o nome de "lepra das vestes" (v.47-59). O facto de ser o sacerdote a fazer o diagnóstico indica que, por detrás da lepra (e de outras doenças), havia forças misteriosas que era preciso esconjurar.
[2] Dermatoses do corpo, que os médicos denominam lepra branca.
[3] Os sinais que devem tornar o leproso reconhecível e facilmente identificável dentro e fora do seu isolamento são os mesmos que os das pessoas enlutadas (Ez 24,17-22), porque a lepra o exclui do mundo dos vivos. Durante o tempo em que os israelitas permaneceram no deserto, os leprosos viviam fora do acampamento; quando se fixaram na Palestina, viviam fora da área habitada, quer das cidades, quer das aldeias (2 Rs 7,3-4; Lc 17,12-13).
[4] "O segredo messiânico", presente também em Mateus e Lucas, aparece quase institucionalizado em Marcos: 1,24-25.34.44; 3,12; 5,43; 7,36; 8,26. Jesus proíbe os demónios de revelarem a sua identidade (1,24-25.34; 3,12), os miraculados de divulgarem os benefícios dele recebidos e os discípulos de transmitir a estranhos os conhecimentos especiais adquiridos por meio dele (8,30; 9,9). Esta atitude de Jesus pode explicar-se pela necessidade de evitar que se faça uma ideia errada do seu messianismo. Ele não é o libertador nacional, mas realiza a sua missão libertadora no íntimo das pessoas. As curas que Jesus opera são sinais messiânicos (4,35-41 nota; Is 35,5-6; Mt 11,2-6.3 nota; Lc 7,22-23). Sobre o segredo messiânico, ver 7,32-37; Mt 12,14-16; Lc 9,21.

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

Contributo para conhecer melhor… – JOSUÉ



JOSUÉ

 Embora nem sempre com a coerência que tanto agrada à nossa mentalidade actual, por efeito das diferentes tradições que lhe serviram de fonte, é possível apresentar resumidamente a figura de Josué. Inicialmente surge como um jovem ajudante de Moisés, com o nome de Oseias; depois, é um dos exploradores do Négueb, quando manifesta, com Caleb, a sua disponibilidade para executar o plano libertador de Javé. Então é-lhe mudado o nome de Oseias para “Yehoshua” ou Josué, prenúncio da nova missão em que Moisés o vai investir: será o seu sucessor.

É a esta personalidade que a tradição atribui a autoria do livro de JOSUÉ, com as habituais limitações que tal designação comporta quando se trata dos autores sagrados ou hagiógrafos.

DIVISÃO E CONTEÚDO

Há quem considere o livro de JOSUÉ como um complemento do Pentateuco, constituindo a parte em que se cumpre a promessa da doação da Terra Prometida: no Génesis, Deus promete; em JOSUÉ, entrega e cumpre a promessa. Nesta hipótese, JOSUÉ seria constituído a partir da teoria clássica das quatro tradições: Javista, Eloísta, Deuteronomista e Sacerdotal. Não é esta, porém, a hipótese aplaudida por muitos críticos modernos, a quem agrada mais integrar o livro em plena História Deuteronomista, sem prejuízo de considerarem nele, de facto, a promessa do Génesis, plenamente cumprida.

É comum distribuir o conteúdo de JOSUÉ por três partes distintas:

I. Conquista de Canaã (1,1-12,24): texto, predominantemente narrativo, conta os vários episódios da conquista de Jericó; a batalha de Guibeon; a leitura da Lei perante a multidão, que renova a sua promessa de fidelidade à aliança (8,29-35); a derrota das várias coligações contra Josué, com a consequente submissão de todo o Sul ao sucessor de Moisés.

II. Distribuição do território pelas tribos (13,1-21,45). Após a atribuição dos territórios às tribos da Transjordânia e da Cisjordânia, conclui-se com uma lista das cidades sacerdotais e de refúgio.

III. Apêndice e conclusão (22,1-24,33). Nesta parte merecem especial atenção o discurso de despedida de Josué e a assembleia magna de Siquém, no final do livro.

GÉNERO LITERÁRIO E VALOR HISTÓRICO

Em JOSUÉ, não temos História no sentido rigoroso deste conceito, uma vez que a aglutinação das diversas tradições foi feita em época muito posterior aos factos. O rigor histórico das narrações é que seria, precisamente, de admirar. Comparando JOSUÉ com Jz 1, aquilo que em JOSUÉ se nos apresenta como campanha militar organizada, uma espécie de coligação de todo o Israel, na verdade, parece ter sido uma iniciativa particular de cada tribo. Trata-se, pois, de apresentações esquematizadas. Do mesmo modo, não é de excluir a hipótese de algumas tribos terem penetrado em Canaã pelo Sul e não por Jericó (Nm 21,1-3).

Tribos houve, como as da região central, que nem sequer terão estado no Egipto, mas permaneceram em Canaã. Outra hipótese admitida é que teria havido vários êxodos de natureza diferente: êxodo-expulsão e êxodo-libertação; assim no-lo deixam supor as várias formas de texto, quando se fala da saída do Egipto. Nesse caso, a campanha de Josué, na reconquista épica de Canaã, revestiria a forma de síntese narrativa como reelaboração posterior das diversas tradições.

Os acontecimentos posteriores, até à época de David, mostram igualmente que a campanha da reconquista protagonizada por Josué não acabou com a posse total do território: muitos grupos de várias etnias não judaicas mantiveram-se autónomos por muitos anos, só mais tarde acabando por ser integrados em Israel.

De quanto ficou dito, pode-se legitimamente concluir que, em JOSUÉ, se encontram misturados vários tipos de textos literários: a narração, a descrição, a lenda popular, a epopeia, etc.. Sacrificou-se o rigor da História ao interesse da doutrinação teológica, realçando esta última.

TEOLOGIA

Como já foi dito, JOSUÉ pretende mostrar que Javé é fiel à sua palavra: se prometeu, cumpre (Gn 12,1-3; 13,14-17; 15,7-21; 17,1-8). Como prometeu dar uma terra ao povo, tudo fará, mesmo milagres, para os opositores de Israel serem derrotados e as suas terras entregues ao “povo de Javé”. Daí a frequência da acção miraculosa da intervenção directa de Deus e dos seus anjos no decorrer das várias acções militares, bem como a idealização do herói, qual novo Moisés: tudo lhe é atribuído, participa em todas as batalhas e sobre ele se estende incessantemente a mão poderosa e protectora do Senhor.

Para isso concorre enormemente a importância do factor ‘Terra’ na trama da aliança: Javé faz um pacto com um povo nómada, a quem promete entregar uma terra que vai ser o cenário dos factos dessa aliança. Sem uma terra sua, o povo carece de raízes para a sua subsistência real. Foi assim que todo o israelita aprendeu a considerar a ‘Terra Prometida’ como um dom do Senhor. Neste quadro, a guerra santa e a crueldade para com o vencido são um louvor a Javé, em cujo nome são praticadas. O empolamento das acções, até se fazer delas milagres assombrosos, está plenamente justificado, uma vez que interessa, acima de tudo, exaltar Javé e engrandecer Josué, figura central da presente epopeia.



sábado, 7 de fevereiro de 2015

LITURGIA DA PALAVRA – DOMINGO V DO TEMPO COMUM




(Domingo IV, 08 de Fevereiro de 2015)


Curou muitas pessoas, atormentadas por várias doenças

LEITURA I – Job 7, 1-4.6-7

Agito-me angustiado até ao crepúsculo

Job é o tipo de todo o homem que sofre e que não sabe encontrar explicação para o sofrimento. No entanto, ele sabe que o Senhor não é estranho a esse sofrimento; por isso, se abandona nas suas mãos, invocando-O e esperando a sua resposta. Se Job tivesse conhecido a Paixão de Cristo seguida da Ressurreição, teria encontrado resposta mais completa para a sua dor!

Leitura do Livro de Job
1«A vida do homem sobre a terra, não é ela uma luta?
Não são os seus dias como os de um assalariado?[1]
2Como um escravo suspira pela sombra, e o jornaleiro espera o seu salário, 3assim eu tive por quinhão meses de sofrimento, e couberam-me em sorte noites cheias de dor.
4Se me deito, digo: 'Quando chegará o dia?'
Se me levanto: 'Quando virá a tarde?'
E encho-me de angústia até chegar a noite.
6Os meus dias passam mais rápido que a lançadeira e desaparecem sem deixar esperança.
7Lembra-te de que a minha vida é um sopro, e os meus olhos não voltarão a ver a felicidade.”

LEITURA II – 1 Cor 9, 16-19.22-23

Ai de mim se não evangelizar!

O que leva S. Paulo a pregar o Evangelho é exclusivamente a consciência que tem de que o deve pregar para salvação de todos. Até o direito que tem de ser assistido materialmente pelos irmãos ele rejeita, para ficar mais livre na sua pregação. E é na fidelidade à urgência deste serviço na fé e no amor a Cristo que ele experimenta a alegria da liberdade.

Leitura da Primeira Epístola do apóstolo S. Paulo aos Coríntios
16Porque, se eu anuncio o Evangelho, não é para mim motivo de glória, é antes uma obrigação que me foi imposta: ai de mim, se eu não evangelizar! 17Se o fizesse por iniciativa própria, mereceria recompensa; mas, não sendo de maneira espontânea, é um encargo que me está confiado. 18Qual é, portanto, a minha recompensa? É que, pregando o Evangelho, eu faço-o gratuitamente, sem me fazer valer dos direitos que o seu anúncio me confere.
19*De facto, embora livre em relação a todos, fiz-me servo de todos, para ganhar o maior número. 22Fiz-me fraco com os fracos, para ganhar os fracos. Fiz-me tudo para todos, para salvar alguns a qualquer custo. 23E tudo faço por causa do Evangelho, para dele me tornar participante[2].”

EVANGELHO – Mc 1, 29-39

Curou muitas pessoas, atormentadas por várias doenças

Ao contrário de Job, sofredor e incapaz de superar o mal, Jesus cura as doenças e expulsa os demónios. Assim Se afirma Senhor da vida e da morte, e anuncia desde já a ressurreição. E quer levar esta Boa Nova a toda a parte; por isso, não se deixa ficar preso pelos interesses, sempre limitativos, dos seus beneficiários, mas alarga a sua acção a todos os lados. Todavia esta actividade tão intensa não O impede de procurar um lugar ermo para aí orar ao Pai.

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Marcos
29Saindo da sinagoga, foram para casa de Simão e André, com Tiago e João. 30A sogra de Simão estava de cama com febre, e logo lhe falaram dela. 31Aproximando-se, tomou-a pela mão e levantou-a. A febre deixou-a e ela começou a servi-los. 32À noitinha, depois do sol-pôr, trouxeram-lhe todos os enfermos e possessos, 33e a cidade inteira estava reunida junto à porta. 34Curou muitos enfermos atormentados por toda a espécie de males e expulsou muitos demónios; mas não deixava falar os demónios, porque sabiam quem Ele era.
35De madrugada, ainda escuro, levantou-se e saiu; foi para um lugar solitário e ali se pôs em oração. 36Simão e os que estavam com Ele seguiram-no. 37E, tendo-o encontrado, disseram-lhe: «Todos te procuram.» 38Mas Ele respondeu-lhes: «Vamos para outra parte, para as aldeias vizinhas, a fim de pregar aí, pois foi para isso que Eu vim.»
39E foi por toda a Galileia, pregando nas sinagogas deles e expulsando os demónios.”





[1] A vida... é uma luta. As comparações utilizadas para descrever a vida humana sobre a terra são tiradas, por um lado, do ambiente militar com as suas características de obrigatoriedade social, de sacrifício e de risco permanente; são ainda retiradas das duras condições em que vivia quem estava sujeito a trabalhar por conta de outrem. Em 14,14, aparece a mesma expressão de combate para representar a aventura da vida.
[2] Livre...servo. Repare-se na força expressiva desta antítese, bem de acordo com os ensinamentos de Jesus (Mt 20,25-28; Mc 10,43-45.45; Lc 22,24-27; Jo 13,4-20). Repete-se 5 vezes a palavra ganhar e 1 vez salvar, para exprimir a missão junto dos judeus, dos pagãos e dos fracos, a cujas necessidades Paulo tem de adaptar-se (Mt 5,43.45-48). Os que vivem sem a Lei são os pagãos, que não dispõem da Lei revelada.