sábado, 10 de setembro de 2016

A EXPERIÊNCIA DO PERDÃO, RENOVAÇÃO DO ÍNTIMO




DOMINGO XXIV DO TEMPO COMUM

O AMOR É GRATUITO
O amor de Deus para com os homens é tão gratuito que não podemos pretender ter direito a ele; é tão absoluto que jamais podemos dizer que nos falta. O amor humano, ao contrário, é tão limitado e fechado pelo nosso egoísmo, tão raramente ultrapassa a estrita justiça ou se liberta da severidade moralista, que facilmente imaginamos um Deus vingador e uma religião baseada no temor. Quem de nós se lembra de que a “graça” que pedimos a Deus significa “ternura e piedade” pelo pecador? Só um estudo atento da palavra de Deus pode ajudar-nos a tomar consciência do sentido da misericórdia indefectível de Deus.
Os judeus usavam o termo hesed para indicar o amor misericordioso de Deus para com o povo. Esse termo indica a benevolência, a solidariedade, o amor mútuo que deve existir entre os membros de uma mesma família ou sociedade, dispostos a ajudarem-se entre si com amor e generosidade. Deus manifesta essa benevolência, antes de tudo, escolhendo Israel como seu povo; prescindindo dos seus méritos, estabelece com ele um pacto de fidelidade e amor (Dt 7,7-15).

Um amor não condicionado pela nossa correspondência
A correspondência de Israel ao amor de Deus, que não é grande mas existe, é agora identificada com o termo hesed, que neste caso significa reconhecimento, amor filial, fidelidade. Entretanto, mesmo quando Israel não observa a aliança, Deus permanece fiel e perdoa, exercendo sempre a hesed, a bondade misericordiosa.
Por esta bondade misericordiosa, o povo, embora pecador e infiel, poderá sempre esperar pelo auxílio divino.
Assim a bondade passa a ser a ternura e a piedade que Deus tem pelo pecador, enquanto lhe oferece a salvação tirando-a do próprio pecado e lhe dá continuamente novos meios, cada vez mais eficazes, para triunfar do mal e corresponder finalmente as exigências da aliança.
Deste modo a bondade torna-se misericórdia para com o pecador. A religião do homem já não se baseia num título de justiça, mas unicamente na caridade de Deus. Lucas, o evangelista da ternura divina, multiplica as narrativas que mostram Jesus em busca dos mais abandonados, dos pobres, dos pecadores, realçando assim o próprio fundamento da nossa religião, que é a atitude dos que são arrebatados pelo abismo do amor de Deus.

Temos ainda necessidade de perdão?
Não tem necessidade de ser perdoado quem não tem consciência de ter traído alguém a quem ama. Mas o homem de hoje sentir-se-á ainda amado? Na sociedade contemporânea há uma difusa sensação de inquietude, devida ao carácter impessoal da nossa civilização. Estamos na era dos grandes aglomerados urbanos, em contacto com a multidão em toda parte: nos meios de transporte, nas fábricas, no cinema, nas praias. O homem está sempre ao lado de outros homens, mas a poucos pode chamar “pelo nome”. Toma-se frequentemente como símbolo da nossa civilização os congestionamentos de trânsito nas nossas cidades ou estradas. Há uma multidão, mas cada um se acha fechado no seu carro, com o seu cansaço, a sua desilusão, muitas vezes com a sua angústia. É grande o número dos que não são amados por ninguém, para os quais não se tem um olhar a não ser com referência à sua eficiência económica. Muitas pessoas sabem que quando já não forem úteis, ninguém mais se interessará por elas. No entanto, só pode ser feliz quem é reconhecido, estimado, apreciado, sobretudo amado. Não existe verdadeira “experiência humana” sem intercâmbio, diálogo, confidência, verdadeiro amor recíproco. Só o amor é capaz de transformar, mas com uma condição: que seja gratuito e livre.

Um Deus de braços abertos
Cristo revelou-nos um Deus como desejamos. Um Deus que é amor e misericórdia. É uma pessoa que dificilmente encontra lugar na nossa sociedade, e esta, por isso mesmo, tem dele necessidade vital. Aparentemente não serve, não é útil, não produz, não entra no jogo da inflação; mas dá-nos tudo, dá-nos o que nenhuma análise científica, nem progresso tecnológico, nem o desenvolvimento das ciências humanas jamais poderá dar-nos: que nos sintamos amados individualmente, um a um, de modo absoluto. Quando percebemos que Deus nos ama assim, então sentimos que estar longe dele e dos outros por razões humanas é perder tempo, e perder Deus. Então nasce espontaneamente a necessidade de pedir perdão.


LEITURA I – Ex 32, 7-11.13-14

O Senhor desistiu do mal com que tinha ameaçado o seu povo

Deus revela-Se através de toda a história da salvação como ‘amigo dos homens’, Aquele que, depois da encarnação do seu Filho, S. João há-de dizer que é Amor. Momentos há, no entanto, em que a Sagrada Escritura atribui a Deus sentimentos de indignação e de ira, para indicar a sua detestação profunda do pecado, como nesta leitura, porque o pecado e a aliança são incompatíveis. Mas, uma vez que o pecador se volte para Ele, logo Se mostra pronto a perdoar-lhe e a acolhê-lo de novo na sua aliança.

Leitura do Livro do Êxodo
“Naqueles dias, o Senhor falou a Moisés, dizendo: «Desce depressa, porque o teu povo, que tiraste da terra do Egipto, corrompeu-se. Não tardaram em desviar-se do caminho que lhes tracei. Fizeram um bezerro de metal fundido, prostraram-se diante dele, ofereceram-lhe sacrifícios e disseram: ‘Este é o teu Deus, Israel, que te fez sair da terra do Egipto’». O Senhor disse ainda a Moisés: «Tenho observado este povo: é um povo de dura cerviz. Agora deixa que a minha indignação se inflame contra eles e os destrua. De ti farei uma grande nação». Então Moisés procurou aplacar o Senhor seu Deus, dizendo: «Por que razão, Senhor, se há-de inflamar a vossa indignação contra o vosso povo, que libertastes da terra do Egipto com tão grande força e mão tão poderosa? Lembrai-Vos dos vossos servos Abraão, Isaac e Israel, a quem jurastes pelo vosso nome, dizendo: ‘Farei a vossa descendência tão numerosa como as estrelas do céu e dar-lhe-ei para sempre em herança toda a terra que vos prometi’». Então o Senhor desistiu do mal com que tinha ameaçado o seu povo.”
Palavra do Senhor

LEITURA II – 1 Tim 1, 12-17

Cristo veio salvar os pecadores

Começamos a ler hoje a primeira epístola de S. Paulo ao seu discípulo Timóteo. Por coincidência, a passagem que hoje se lê encerra uma palavra de acção de graças a Deus pela sua misericórdia revelada na conversão de Paulo. Assim, esta leitura nos fará compreender melhor a mensagem das outras duas.

Leitura da Epístola do apóstolo São Paulo a Filémon
“Caríssimo: Dou graças Àquele que me deu força, Jesus Cristo, Nosso Senhor, que me julgou digno de confiança e me chamou ao seu serviço, a mim que tinha sido blasfemo, perseguidor e violento. Mas alcancei misericórdia, porque agi por ignorância, quando ainda era descrente. A graça de Nosso Senhor superabundou em mim, com a fé e a caridade que temos em Cristo Jesus. É digna de fé esta palavra e merecedora de toda a aceitação: Cristo Jesus veio ao mundo para salvar os pecadores e eu sou o primeiro deles. Mas alcancei misericórdia, para que, em mim primeiramente, Jesus Cristo manifestasse toda a sua magnanimidade, como exemplo para os que hão-de acreditar n’Ele, para a vida eterna. Ao Rei dos séculos, Deus imortal, invisível e único, honra e glória pelos séculos dos séculos. Amen.”
Palavra do Senhor

EVANGELHO – Lc 15, 1-32

Haverá alegria entre os Anjos de Deus por um só pecador que se arrependa

O amor de Deus não é uma palavra vaga sem sentido. Com três parábolas, qual delas a mais impressionante, o Senhor Se esforça por nos fazer sentir esse amor de misericórdia, que não cessa de nos convidar ao arrependimento, para nos perdoar e nos unir a Si.

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas
“Naquele tempo, os publicanos e os pecadores aproximavam-se todos de Jesus, para O ouvirem. Mas os fariseus e os escribas murmuravam entre si, dizendo: «Este homem acolhe os pecadores e come com eles». Jesus disse-lhes então a seguinte parábola: «Quem de vós, que possua cem ovelhas e tenha perdido uma delas, não deixa as outras noventa e nove no deserto, para ir à procura da que anda perdida, até a encontrar? Quando a encontra, põe-na alegremente aos ombros e, ao chegar a casa, chama os amigos e vizinhos e diz-lhes: ‘Alegrai-vos comigo, porque encontrei a minha ovelha perdida’. Eu vos digo: Assim haverá mais alegria no Céu por um só pecador que se arrependa, do que por noventa e nove justos, que não precisam de arrependimento. Ou então, qual é a mulher que, possuindo dez dracmas e tendo perdido uma, não acende uma lâmpada, varre a casa e procura cuidadosamente a moeda até a encontrar? Quando a encontra, chama as amigas e vizinhas e diz-lhes: ‘Alegrai-vos comigo, porque encontrei a dracma perdida’. Eu vos digo: Assim haverá alegria entre os Anjos de Deus por um só pecador que se arrependa». Jesus disse-lhes ainda: «Um homem tinha dois filhos. O mais novo disse ao pai: ‘Pai, dá-me a parte da herança que me toca’. O pai repartiu os bens pelos filhos. Alguns dias depois, o filho mais novo, juntando todos os seus haveres, partiu para um país distante e por lá esbanjou quanto possuía, numa vida dissoluta. Tendo gasto tudo, houve uma grande fome naquela região e ele começou a passar privações. Entrou então ao serviço de um dos habitantes daquela terra, que o mandou para os seus campos guardar porcos. Bem desejava ele matar a fome com as alfarrobas que os porcos comiam, mas ninguém lhas dava. Então, caindo em si, disse: ‘Quantos trabalhadores de meu pai têm pão em abundância, e eu aqui a morrer de fome! Vou-me embora, vou ter com meu pai e dizer-lhe: Pai, pequei contra o Céu e contra ti. Já não mereço ser chamado teu filho, mas trata-me como um dos teus trabalhadores’. Pôs-se a caminho e foi ter com o pai. Ainda ele estava longe, quando o pai o viu: enchendo-se de compaixão, correu a lançar-se-lhe ao pescoço, cobrindo-o de beijos. Disse-lhe o filho: ‘Pai, pequei contra o Céu e contra ti. Já não mereço ser chamado teu filho’. Mas o pai disse aos servos: ‘Trazei depressa a melhor túnica e vesti-lha. Ponde-lhe um anel no dedo e sandálias nos pés. Trazei o vitelo gordo e matai-o. Comamos e festejemos, porque este meu filho estava morto e voltou à vida, estava perdido e foi reencontrado’. E começou a festa. Ora o filho mais velho estava no campo. Quando regressou, ao aproximar-se da casa, ouviu a música e as danças. Chamou um dos servos e perguntou-lhe o que era aquilo. O servo respondeu-lhe: ‘O teu irmão voltou e teu pai mandou matar o vitelo gordo, porque ele chegou são e salvo’. Ele ficou ressentido e não queria entrar. Então o pai veio cá fora instar com ele. Mas ele respondeu ao pai: ‘Há tantos anos que eu te sirvo, sem nunca transgredir uma ordem tua, e nunca me deste um cabrito para fazer uma festa com os meus amigos. E agora, quando chegou esse teu filho, que consumiu os teus bens com mulheres de má vida, mataste-lhe o vitelo gordo’. Disse-lhe o pai: ‘Filho, tu estás sempre comigo e tudo o que é meu é teu. Mas tínhamos de fazer uma festa e alegrar-nos, porque este teu irmão estava morto e voltou à vida, estava perdido e foi reencontrado’».”
Palavra da Salvação



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