4.º Domingo da
Quaresma
“Cristo, luz para nossas trevas”
Como a água, também a luz – com seu oposto, a escuridão – é um dos
símbolos fundamentais da existência humana e da reflexão religiosa. No relato
do Génesis, Deus, pela criação da luz e a sua separação das trevas, põe ordem e
distinção no caos primitivo, e torna-o um cosmos cognoscível e depois
habitável.
Na plenitude dos tempos, a Palavra de Deus veio habitar no meio de nós.
Vida e luz de todo ser vivo, ela ilumina com nova luz aquele que crê na Palavra
feita homem, na mensagem tornada pessoa viva, concreta e histórica, no Filho do
Deus invisível que dá a conhecer o Pai. Esses são os grandes temas
desenvolvidos por João desde o prólogo do seu evangelho, e ilustrados através
de uma série de “sinais”, diante dos quais só há uma alternativa: responder sim
ou não, sem atenuantes.
A luz do nosso baptismo
Acolher a luz significa crer naquele que o Pai enviou, reconhecer que as suas
obras vêm de Deus, entrar na vida nova mediante os sinais sacramentais e assim,
pela fé, as obras e os ritos, participar da sua ressurreição, vitória da luz
sobre as trevas, do bem sobre o mal, da vida sobre a morte.
No baptismo, de que a água da fonte de Siloé é figura, recebemos a luz
que nos faz filhos de Deus, e somos “iluminados”. “Quando um homem nasce para a
vida nova é imediatamente libertado das trevas e, a partir desse momento,
recebe a luz. É o mesmo que acontece quando, de repente, acordamos; ou melhor,
é o que sucede com quem quer retirar a catarata dos próprios olhos: não deverá
buscar fora a luz que não tem, mas terá que libertar a pupila, afastando aquilo
que impede a visão. Do mesmo modo, também nós, como baptismo, somos purificados
dos pecados, que como uma nuvem velavam o Espírito divino, e assim o olho do
espírito torna-se transparente e luminoso e faz-nos contemplar as coisas
divinas: o Espírito Santo desce, então, do alto sobre nós”. A escolha da luz
tem também um valor profético e escatológico: o juízo já está presente, mas
será explícito e definitivo quando resplandecer a glória do Ressuscitado; quem
crê já está salvo desde agora; quem não crê – porque não quer ver – permanece no
seu pecado.
“Comportai-vos
como filhos da luz”
Baptizados no Cristo Jesus, passamos das trevas para a luz. Vemos o
sentido da nossa vida e do destino do mundo à luz de Cristo, somos chamados a
crescer numa perfeita comunhão de vida com Deus, a escolher e a viver – como
Cristo – a vontade do Pai. Não podemos agir como os que não sabem; não podemos
esconder-nos da luz que nos foi dada, sem assim nos comprometermos com um
destino de trevas eternas; não podemos recusar professar a nossa fé e agir “com
toda bondade, justiça e verdade”. O testemunho da luz é a resposta consciente,
livre e cheia de amor àquele que iluminou os nossos olhos com a luz sem ocaso.
Os olhos do
homem tornam-se mais opacos
Estamos a assistir, hoje, a um fenómeno estranho; enquanto os olhos da
ciência se tornam mais luminosos, tornam-se mais opacos os olhos do homem.
Os nossos objectivos científicos, económicos, políticos são mais
distintos e precisos: atravessamos barreiras jamais violadas pelo olho do homem
em todos os campos do saber positivo; os nossos conhecimentos crescem em ritmo
vertiginoso; existem cérebros electrónicos para imaginá-los e impedir que nos
percamos num labirinto tão vasto e complexo.
Mas o homem torna-se cada vez menos claro, cada vez mais indecifrável a
si mesmo. “O homem é um cigano perdido num universo enregelado que lhe é
totalmente indiferente” (Monod, prémio Nobel de medicina). Parece que o
mistério do homem se fecha num horizonte de trevas, sem que um raio de luz
possa filtrar-se entre as redes do mistério.
Só Cristo
consegue lançar luz sobre essas trevas
O baptismo – que é “iluminação” – significa abrir os nossos olhos para
Deus e o seu mistério, para o mistério do homem, para o sentido da vida, do
sofrimento e da morte, do nosso destino individual e colectivo, para o sentido
da história.
Renunciar a Cristo significa recair nas trevas mais obscuras.
ANTÍFONA DE ENTRADA – Is 66,
10-11
Alegra-te, Jerusalém; rejubilai, todos os seus amigos.
Exultai de alegria, todos vós que participastes no seu luto
e podereis beber e saciar-vos na abundância das suas consolações.
ORAÇÃO COLECTA
Deus
de misericórdia, que, pelo vosso Filho,
realizais
admiravelmente a reconciliação do género humano, concedei ao povo cristão fé
viva e espírito generoso,
a
fim de caminhar alegremente
para
as próximas solenidades pascais.
Por
Nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho,
que
é Deus convosco na unidade do Espírito Santo.
LEITURA I – 1 Sam 16,
1b.6-7.10-13a
“David é
ungido rei de Israel.”
Continuamos a ler, como
primeira leitura dos domingos da Quaresma, algumas das passagens mais
significativas da história da salvação do Antigo Testamento, para assim compreendermos
melhor como a Páscoa de Jesus é o ponto culminante de toda essa história. Hoje
lemos a unção de David como rei de Israel. David é um antepassado de Jesus, a
quem foi feita a promessa de que um descendente seu seria o grande Rei do povo
de Deus. Jesus é esse Rei, Filho de David, mas ao mesmo tempo, Filho de Deus,
como Ele próprio Se revela no Evangelho. É Ele que vem para conduzir os homens,
como seu Pastor, até ao Pai.
Leitura do
Primeiro Livro de Samuel
“Naqueles
dias, o Senhor disse a Samuel: «Enche a âmbula de óleo e parte. Vou enviar-te a
Jessé de Belém, pois escolhi um rei entre os seus filhos». Quando chegou,
Samuel viu Eliab e pensou consigo: «Certamente é este o ungido do Senhor». Mas
o Senhor disse a Samuel: «Não te impressiones com o seu belo aspecto, nem com a
sua elevada estatura, pois não foi esse que Eu escolhi. Deus não vê como o
homem; o homem olha às aparências, o Senhor vê o coração». Jessé fez passar os
sete filhos diante de Samuel, mas Samuel declarou-lhe: «O Senhor não escolheu
nenhum destes». E perguntou a Jessé: «Estão aqui todos os teus filhos?». Jessé
respondeu-lhe: «Falta ainda o mais novo, que anda a guardar o rebanho». Samuel
ordenou: «Manda-o chamar, porque não nos sentaremos à mesa, enquanto ele não
chegar». Então Jessé mandou-o chamar: era ruivo, de belos olhos e agradável
presença. O Senhor disse a Samuel: «Levanta-te e unge-o, porque é este mesmo».
Samuel pegou na âmbula do óleo e ungiu-o no meio dos irmãos. Daquele dia em
diante, o Espírito do Senhor apoderou-Se de David.”
Palavra do Senhor
SALMO RESPONSORIAL – Salmo
22 (23), 1-3a.3b-4.5.6 (R. 1)
Refrão: O Senhor é meu pastor:
nada me faltará. (Repete-se)
O Senhor é meu pastor: nada
me falta.
Leva-me a descansar em
verdes prados,
conduz-me às águas
refrescantes
e reconforta a minha alma. (Refrão)
Ele
me guia por sendas direitas
por
amor do seu nome.
Ainda
que tenha de andar por vales tenebrosos,
não
temerei nenhum mal, porque Vós estais comigo:
o
vosso cajado e o vosso báculo
me
enchem de confiança. (Refrão)
Para
mim preparais a mesa
à
vista dos meus adversários;
com
óleo me perfumais a cabeça
e
meu cálice transborda. (Refrão)
A
bondade e a graça hão-de acompanhar-me
todos
os dias da minha vida,
e
habitarei na casa do Senhor
para
todo o sempre. (Refrão)
LEITURA II – Ef 5, 8-14
“Desperta
e levanta-te do meio dos mortos, e Cristo brilhará sobre ti”
Este
é o Domingo da luz, da iluminação. Essa luz é Cristo, como se diz no final da
leitura, numa passagem que é talvez parte de um hino cristão primitivo. O Baptismo
é o sacramento da iluminação, da fé, que havemos de professar, de novo, na
Vigília Pascal. Se na nossa comunidade houver catecúmenos (que nesta altura, já
serão “eleitos”), eles nos ajudarão a sentir como se deve olhar para o baptismo
como o momento da “iluminação”, conforme os antigos lhe chamavam.
Leitura da
Epístola do apóstolo São Paulo aos Efésios
“Irmãos:
Outrora vós éreis trevas, mas agora sois luz no Senhor. Vivei como filhos da
luz, porque o fruto da luz é a bondade, a justiça e a verdade. Procurai sempre
o que mais agrada ao Senhor. Não tomeis parte nas obras das trevas, que nada
trazem de bom; tratai antes as denunciar abertamente, porque o que eles fazem
em segredo até é vergonhoso dizê-lo. Mas todas as coisas que são condenadas são
postas a descoberto pela luz, e tudo o que assim se manifesta torna-se luz. É
por isso que se diz: «Desperta, tu que dormes; levanta-te do meio dos mortos e
Cristo brilhará sobre ti».”
Palavra do Senhor
ACLAMAÇÃO ANTES DO EVANGELHO
– Jo 8, 12
Refrão: Glória a Vós, Jesus Cristo, Palavra do Pai (Repete-se)
Eu
sou a luz do mundo, diz o Senhor.
Quem
Me segue terá a luz da vida. (Refrão)
EVANGELHO – Jo 9, 1-41
“Eu fui, lavei-me e comecei a ver”
Jesus,
que no domingo anterior Se revelou como Aquele que dá a água da vida, revela-Se
hoje como a luz que ilumina o homem. O cego de nascença é figura de toda a
humanidade, que tacteia, neste mundo, como que às apalpadelas, a caminho da
vida, caminho que só Deus lhe pode desvendar. O Baptismo é o banho que ilumina,
porque nos faz mergulhar em Cristo que é a luz. Os antigos chamavam justamente
ao Baptismo a “iluminação”.
Evangelho de
Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São João
“Naquele
tempo, Jesus encontrou no seu caminho um cego de nascença. Os discípulos
perguntaram-Lhe: «Mestre, quem é que pecou para ele nascer cego? Ele ou os seus
pais?». Jesus respondeu-lhes: «Isso não tem nada que ver com os pecados dele ou
dos pais; mas aconteceu assim para se manifestarem nele as obras de Deus. É
preciso trabalhar, enquanto é dia, nas obras d’Aquele que Me enviou. Vai chegar
a noite, em que ninguém pode trabalhar. Enquanto Eu estou no mundo, sou a luz
do mundo». Dito isto, cuspiu em terra, fez com a saliva um pouco de lodo e
ungiu os olhos do cego. Depois disse-lhe: «Vai lavar-te à piscina de Siloé»;
Siloé quer dizer «Enviado». Ele foi, lavou-se e ficou a ver. Entretanto,
perguntavam os vizinhos e os que antes o viam a mendigar: «Não é este o que
costumava estar sentado a pedir esmola?». Uns diziam: «É ele». Outros
afirmavam: «Não é. É parecido com ele». Mas ele próprio dizia: «Sou eu».
Perguntaram-lhe então: «Como foi que se abriram os teus olhos?». Ele respondeu:
«Esse homem, que se chama Jesus, fez um pouco de lodo, ungiu-me os olhos e
disse-me: ‘Vai lavar-te à piscina de Siloé’. Eu fui, lavei-me e comecei a ver».
Perguntaram-lhe ainda: «Onde está Ele?». O homem respondeu: «Não sei». Levaram
aos fariseus o que tinha sido cego. Era sábado esse dia em que Jesus fizera
lodo e lhe tinha aberto os olhos. Por isso, os fariseus perguntaram ao homem
como tinha recuperado a vista. Ele declarou-lhes: «Jesus pôs-me lodo nos olhos;
depois fui lavar-me e agora vejo». Diziam alguns dos fariseus: «Esse homem não
vem de Deus, porque não guarda o sábado». Outros observavam: «Como pode um
pecador fazer tais milagres?». E havia desacordo entre eles. Perguntaram então
novamente ao cego: «Tu que dizes d’Aquele que te deu a vista?». O homem
respondeu: «É um profeta». Os judeus não quiseram acreditar que ele tinha sido
cego e começara a ver. Chamaram então os pais dele e perguntaram-lhes: «É este
o vosso filho? É verdade que nasceu cego? Como é que ele agora vê?». Os pais
responderam: «Sabemos que este é o nosso filho e que nasceu cego; mas não
sabemos como é que ele agora vê, nem sabemos quem lhe abriu os olhos. Ele já
tem idade para responder; perguntai-lho vós». Foi por medo que eles deram esta
resposta, porque os judeus tinham decidido expulsar da sinagoga quem
reconhecesse que Jesus era o Messias. Por isso é que disseram: «Ele já tem
idade para responder; perguntai-lho vós». Os judeus chamaram outra vez o que
tinha sido cego e disseram-lhe: «Dá glória a Deus. Nós sabemos que esse homem é
pecador». Ele respondeu: «Se é pecador, não sei. O que sei é que eu era cego e
agora vejo». Perguntaram-lhe então: «Que te fez Ele? Como te abriu os olhos?».
O homem replicou: «Já vos disse e não destes ouvidos. Porque desejais ouvi-lo
novamente? Também quereis fazer-vos seus discípulos?». Então insultaram-no e
disseram-lhe: «Tu é que és seu discípulo; nós somos discípulos de Moisés. Nós
sabemos que Deus falou a Moisés; mas este, nem sabemos de onde é». O homem
respondeu-lhes: «Isto é realmente estranho: não sabeis de onde Ele é, mas a
verdade é que Ele me deu a vista. Ora, nós sabemos que Deus não escuta os
pecadores, mas escuta aqueles que O adoram e fazem a sua vontade. Nunca se
ouviu dizer que alguém tenha aberto os olhos a um cego de nascença. Se Ele não
viesse de Deus, nada podia fazer». Replicaram-lhe então eles: «Tu nasceste
inteiramente em pecado e pretendes ensinar-nos?». E expulsaram-no. Jesus soube
que o tinham expulsado e, encontrando-o, disse-lhe: «Tu acreditas no Filho do
homem?». Ele respondeu-Lhe: «Quem é, Senhor, para que eu acredite n'Ele?».
Disse-lhe Jesus: «Já O viste: é quem está a falar contigo». O homem prostrou-se
diante de Jesus e exclamou: «Eu creio, Senhor». Então Jesus disse: «Eu vim a
este mundo para exercer um juízo: os que não vêem ficarão a ver; os que vêem
ficarão cegos». Alguns fariseus que estavam com Ele, ouvindo isto,
perguntaram-Lhe: «Nós também somos cegos?». Respondeu-lhes Jesus: «Se fôsseis
cegos, não teríeis pecado. Mas como agora dizeis: ‘Nós vemos’, o vosso pecado
permanece».”
Palavra da Salvação
ORAÇÃO SOBRE AS OBLATAS
Ao
apresentarmos com alegria estes dons de vida eterna,
humildemente
Vos pedimos, Senhor,
a
graça de os celebrar com verdadeira fé
e
de os oferecer dignamente pela salvação do mundo.
Por
Nosso Senhor.
ANTÍFONA DA COMUNHÃO
Quando se lê o Evangelho do cego de nascença: (cf. Jo 9, 11)
O Senhor ungiu os meus olhos.
Eu fui lavar-me, comecei a ver e acreditei em Deus.
Quando se lê o Evangelho do filho pródigo: (Lc 15, 32)
Alegra-te, meu filho, porque o teu irmão estava morto e voltou à vida,
estava perdido e foi encontrado.
Quando se lê o outro Evangelho: (Salmo 121, 3-4)
Jerusalém, cidade de Deus,
para ti sobem as tribos do Senhor,
para celebrar o seu santo nome.
ORAÇÃO DEPOIS DA COMUNHÃO
Senhor nosso Deus,
luz de todo o homem que vem
a este mundo,
iluminai os nossos corações
com o esplendor da vossa graça,
para que pensemos sempre no
que Vos é agradável
e Vos amemos de todo o
coração.
Por Nosso Senhor Jesus
Cristo, vosso Filho,
que é Deus convosco na
unidade do Espírito Santo.
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